As doenças autoimunes são um grupo de doenças distintas que têm como origem o fato do sistema imunológico passar a produzir anticorpos contra componentes do nosso próprio organismo. Por motivos variados e nem sempre esclarecidos, o nosso corpo começa a confundir suas próprias proteínas com agentes invasores, passando a atacá-las.
O que é o sistema imunológico?
Para entender o que é uma reação autoimune é preciso antes conhecer um pouco do nosso sistema imunológico. Tentarei ser breve e sucinto nesta explicação, até porque este assunto é extremamente complexo e extenso, o que o torna de muito difícil entendimento para a população leiga.
Nosso organismo possui um complexo sistema de defesa contra invasões de agentes externos, sejam estes bactérias, vírus, fungos, parasitas, proteínas, ou qualquer outro ser ou substância que não seja natural do corpo. Este sistema de defesa é chamado de sistema imunológico.
O processo evolutivo criou um mecanismo de defesa capaz de reconhecer praticamente qualquer invasão ou agressão ao nosso corpo. A complexidade do sistema está exatamente em conseguir distinguir entre:
1. O que é danoso ao organismo, como vírus e bactérias;
2. O que faz parte do nosso próprio corpo, como células, tecidos e órgãos;
3. O que não é naturalmente nosso, mas não causa danos, como, por exemplo, alimentos que entram no corpo pela boca.
Toda vez que o sistema imunológico se depara com alguma substância estranha, que ele interprete como potencialmente danosa, ele passa a produzir células de defesa e anticorpos para combatê-la. Toda substância estranha capaz de desencadear uma resposta imunológica é chamada de antígeno.
Durante a nossa formação enquanto feto, nosso organismo começa a criar o sistema imunológico. O primeiro trabalho é reconhecer tudo o que é próprio, para mais tarde poder reconhecer o que é estranho. O útero materno é um ambiente estéril, ou seja, livre de agentes infecciosos.
Assim que nascemos somos imediatamente expostos a um “mundo hostil” com uma enormidade de antígenos. Desde o parto, o corpo começa a reconhecer, catalogar e atacar tudo que não é “original de fábrica”. Esse contato com antígenos nos primeiros anos de vida é importante para a formação de uma “biblioteca de anticorpos”.
O corpo consegue montar uma resposta imune muito mais rápida se já houver dados sobre o invasor. Se o antígeno for completamente novo, é necessário algum tempo até que o organismo descubra quais os anticorpos são mais indicados para combater aquela partícula.
- Essa é a lógica por trás das vacinas. Expomos o paciente a um antígeno, seja ele um vírus ou bactéria, mortos ou fracos, de forma a estimular o sistema imunológico a criar anticorpos contra esses germes.
- Quando a bactéria de verdade nos invadir, já temos pronto um arsenal imunológico para eliminá-la rapidamente, antes que a mesma consiga provocar qualquer doença.
O que é uma doença autoimune?
A doença autoimune ocorre quando o sistema de defesa perde a capacidade de reconhecer o que é “original de fábrica”, levando à produção de anticorpos contra células, tecidos ou órgãos do próprio corpo.
→ Exemplo 1: no diabetes tipo 1 ocorre uma produção inapropriada de anticorpos contra as células do pâncreas que produzem insulina, levando a sua destruição e ao aparecimento do diabetes.
→ Exemplo 2: na esclerose múltipla, o sistema imunológico começa a produzir anticorpos contra componentes dos neurônios, causando destruição dos mesmos e graves problemas neurológicos.
→ Exemplo 3: na tireoidite de Hashimoto, o corpo passa a produzir anticorpos contra a nossa própria glândula tireoide, destruindo-a, levando o paciente a desenvolver hipotireoidismo.
A gravidade de uma doença autoimune depende dos órgãos afetados. Por exemplo, a tireoidite de Hashimoto é uma doença praticamente restrita à glândula tireoide, que é um órgão importante, mas não é vital. Os pacientes com essa doença autoimune conseguem levar uma vida normal apenas tomando um comprimido por dia de hormônio tireoidiano.
Outras doenças autoimunes, porém, são mais graves, principalmente aquelas que atacam órgãos e estruturas nobres do corpo, como o sistema nervoso central, coração, pulmões e/ou os vasos sanguíneos.
Sintomas
Apesar de os pacientes com doenças autoimunes poderem apresentar alguns sinais e sintomas inespecíficos, como cansaço, febre baixa, desânimo, emagrecimento e mal-estar geral, a verdade é que o quadro clínico de cada doença autoimune é muito diferente.
Doenças como, por exemplo, lúpus, diabetes tipo 1 e psoríase atacam órgãos diferentes, de formas distintas, e por isso, apresentam sinais e sintomas próprios. Elas são doenças tão diferentes que são tratadas por especialistas distintos, como endocrinologista, reumatologista e dermatologista, respectivamente. A única semelhança entre elas é o fato de terem origem autoimune.
Não existe, portanto, um sintoma que seja específico das doenças autoimunes. Cada doença tem seu próprio quadro clínico.
O diagnóstico das patologias autoimunes é habitualmente feito com base no quadro clínico e na pesquisa de auto-anticorpos no sangue. O auto-anticorpo mais comum é o FAN (ANA), que pode estar positivo em várias, mas não todas, doenças autoimunes.
Causas
Não sabemos exatamente por que as doenças autoimunes surgem. A teoria mais aceita atualmente é de que o sistema imunológico, após ser exposto a um antígeno, escolhe como alvo para a produção de anticorpos uma proteína semelhante a outra já existente em nosso organismo.
- Por exemplo, sabemos que pacientes com a síndrome de Guillain-Barré frequentemente apresentam um quadro de diarreia infecciosa causada pela bactéria Campylobacter jejuni semanas antes da doença se manifestar.
- Imagina-se que o sistema imunológico possa criar anticorpos contra algumas das proteínas das bactérias que sejam parecidas com proteínas existentes nos nossos neurônios.
- Esta semelhança pode confundir os anticorpos, fazendo com que os mesmos ataquem estruturas do sistema nervoso julgando que estão atacando a bactéria Campylobacter jejuni.
Qual é o médico que trata as doenças autoimunes?
Quando a doença autoimune atinge apenas um órgão, ela costuma ser tratada pelo médico especialista da área.
- Por exemplo, a nefropatia membranosa ou a nefrite lúpica isolada são tratadas pelo nefrologista; a hepatite auto-imune pelo hepatologista ou pelo gastroenterologista;
- a psoríase é tratada pelo dermatologista,
- a esclerose múltipla pelo neurologista e assim por diante.
*Quando a doença autoimune atinge vários tecidos, o seguimento do paciente costuma ser realizado por reumatologista ou por clínico geral especializado em autoimunidade.
- Exemplos: lúpus eritematoso sistêmico, doença de Behçet, artrite reumatoide e granulomatose de Wegener.
Tratamento
O tratamento da maioria das doenças autoimunes consiste na inibição do sistema imunológico através de drogas imunossupressoras, como corticoides, ciclofosfamida, ciclosporina, micofenolato mofetil, rituximab, azatioprina, etc.
O problema do tratamento das doenças autoimunes com drogas imunossupressoras é o fato de não conseguimos realizar uma imunossupressão seletiva aos anticorpos indesejáveis. Ou seja, não conseguimos inibir o funcionamento apenas dos anticorpos danosos e acabamos por criar um estado de imunossupressão geral que predispõe esses pacientes a infecções por bactérias, vírus e fungos.
Geralmente cada doença autoimune tem seu esquema próprio de tratamento. Algumas delas, inclusive, como diabetes tipo 1 e tireoidite de Hashimoto, não são nem tratadas com drogas imunossupressoras. Não existe um tratamento único que sirva para qualquer doença autoimune.
Lista das principais doenças autoimunes
Abaixo fornecemos uma lista com mais de 120 exemplos de doenças de origem autoimune confirmada ou suspeita:
A
Adipose dolorosa
Artrite reumatoide
Alopecia areata
Artrite reativa
Artrite juvenil
Anemia perniciosa
Anemia aplástica
Angioedema autoimune
Anemia hemolítica autoimune
Arterite celular gigante
Artrite psoriásica
Aplasia pura de células vermelhas
C
Crioglobulinemia mista essencial
Conjuntivite Lignea
Colangite esclerosante primária
Cirrose biliar primária
Colite microscópica
Coreia de Sydenham
D
Doença de Addison
Dermatite herpetiforme
Dermatose por IgA linear
Dermatomiosite
Diabetes mellitus tipo 1
Doença autoimune do ouvido interno
Doença celíaca
Doença de Crohn
Doença de Graves
Doença de Goodpasture
Doença de Still
Doença mista do tecido conjuntivo
Dermatite autoimune por progesterona
Degeneração cerebelar paraneoplásica
Doença de Lyme crônica
Doença de Mucha-Habermann
Doença de Behçet
Doença de Ménière
Doença de Kawasaki
Doenças desmielinizantes inflamatórias idiopáticas
Doença sistêmica relacionada com IgG4
E
Entesite
Esclerodermia sistêmica
Esclerose múltipla
Esofagite eosinofílica
Epidermólise bolhosa
Eritema nodoso
Encefalomielite disseminada aguda
Esclerose concêntrica de Balo
Encefalite de Bickerstaff
Espondilite anquilosante
Enteropatia auto-imune
F
Fasciite eosinofílica
Fenômeno de Raynaud
Fibrose retroperitoneal
Febre reumática.
G
Granulomatose de Wegener (granulomatose com poliageíte)
H
Hepatite auto-imune
I
Imunodeficiência primária
L
Lichen planus
Liquen escleroso
Lúpus eritematoso sistêmico
M
Morphea
Miosite do corpo de inclusão
Miastenia gravis
Mielite transversa
N
Neuromelite optica
Nefropatia membranosa
Nefropatia por IgA (Doença de Berger)
Neuromiotonia
Neuropatia axonal motora aguda
Neuropatia inflamatória progressiva
Neurite óptica
Neutropenia autoimune
O
Ooforite autoimune
Orquite autoimune
Oftalmia simpática
Oftalmopatia de Graves
P
PANDAS (transtornos neuropsiquiátricos associados ao estreptococo)
Polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica
Penfigóide cicatricial
Penfigóide bolhoso
Penfigóde gestacional
Purpura trombocitopênica idiopática
Pênfigo vulgar
Pancreatite autoimune
Pitiríase lichenoides et varioliformis acuta
Poliarterite nodosa
Polimialgia reumática
Polimiosite
Psoríase
Poliquondrite recidivante
Pioderma gangrenoso
Purpura de Henoch-Schonlein
Poliangeíte microscópica
R
Reumatismo palindrômico
Retinopatia autoimune
Retocolite ulcerativa
S
Sarcoidose
Síndrome de Felty
Síndrome de Schnitzler
Síndrome da fadiga crônica
Síndrome de Sjögren
Síndrome da pessoa rígida
Síndrome de Susac
Síndrome do mioclonia de Opsoclonus
Síndrome de Parry Romberg
Síndrome de Parsonage-Turner
Síndrome de Churg-Strauss
Síndrome de Tolosa-Hunt
Síndrome de Evans
Síndrome de Cogan
Síndrome de dor regional complexa
Síndrome do anticorpo antifosfolipídico
Síndrome de polimorfeno autoimune
Síndrome linfoproliferativa autoimune
Síndrome POEMS
Síndrome de Guillain-Barré
Síndrome miastênica Lambert-Eaton
T
Trombocitopenia
Tireoidite de Ord
Tireoidite autoimune
Tireoidite de Hashimoto
U
Urticária autoimune
Uveíte autoimune
Úlcera de Mooren
V
Vasculites
Vitiligo
Fonte: MD Saúde, site médico
Nenhum comentário:
Postar um comentário